O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), não conheceu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) proposta pela Federação Nacional das Empresas de Transporte de Valores (Fenaval). A federação buscava a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos que impõem cotas obrigatórias para a contratação de pessoas com deficiência (PcDs) e jovens aprendizes no setor de transporte de valores, especialmente nas atividades de vigilância armada, que exigem alto preparo físico e curso específico supervisionado pela Polícia Federal (PF).
Na avaliação de Mendes, a Fenaval não possui legitimidade ativa para iniciar um processo de controle normativo abstrato no STF. O ministro argumentou que, dentro da estrutura sindical, somente as confederações sindicais detêm legitimidade para tanto. Embora a jurisprudência da Corte tenha admitido em um primeiro momento a legitimidade das federações sindicais para proposição de ações, Mendes ressaltou que essa orientação já foi superada. Atualmente, o entendimento é firme de que federações sindicais não podem instaurar legitimamente processo de fiscalização normativa no STF.
“É certo, ainda, que o fato de consubstanciar uma associação vinculada ao sistema sindical impede que se considere, para efeito de legitimidade para o controle concentrado, como uma entidade de classe de caráter nacional“, destacou o ministro.
No caso em análise, de acordo com Mendes, a Fenaval constitui uma federação sindical – uma entidade sindical de segundo grau – consoante seu próprio estatuto, com registro sindical emitido pelo Ministério do Trabalho (MPT). Por essa razão, ele concluiu que “não se pode, pois, na linha da jurisprudência desta Corte, reconhecer sua legitimidade ativa ad causam para o controle concentrado“. O ministro enfatizou que a legitimidade das entidades sindicais para propor ADIs se restringe às confederações sindicais que se constituam de, no mínimo, três federações, conforme a legislação ordinária.
ARGUMENTOS DA FENAVAL
Na ADI 7668, a Fenaval questionava o artigo 93 da Lei 8.213/1991, que estabelece cotas de 2% a 5% dos cargos para pessoas com deficiência (PcD) ou beneficiários reabilitados em empresas com mais de 100 funcionários. A federação também contestava o artigo 429 da CLT, que obriga as empresas a contratarem um percentual entre 5% e 15% de jovens aprendizes.
A Fenaval alegava que, embora a inclusão dessas categorias no mercado de trabalho seja constitucionalmente protegida e socialmente desejável, a exigência legal se torna inconstitucional quando impõe riscos à integridade física desses trabalhadores ou é de cumprimento inviável por falta de candidatos aptos. Além disso, a federação afirmava que a aplicação indiscriminada dessas cotas, sem considerar as peculiaridades de certas atividades de risco, como a vigilância armada, viola preceitos constitucionais que protegem a vida, a saúde e a dignidade dos trabalhadores.
Também argumentava que a natureza da atividade e os altos riscos envolvidos no cargo justificam a exclusão dessas pessoas do cálculo de cotas. Segundo a federação, sindicatos do setor têm excluído o número de vigilantes armados da base de cálculo dos cotistas, mas essa prática vem sendo questionada pelo MPT.
Em junho de 2024, o ministro Gilmar Mendes solicitou as manifestações da Advocacia-Geral da União (AGU), do Congresso Nacional, da Presidência da República e da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A AGU manifestou-se contra a exclusão do cargo de vigilante armado em empresas de transporte de valores do cálculo das cotas destinadas às pessoas com deficiência (PcDs) e jovens aprendizes. À época, o advogado-geral da União substituto, Flávio José Roman, afirmou que a legislação visa “garantir a igualdade de oportunidades, a integração social e a promoção de um ambiente de trabalho inclusivo, assegurando que PcDs e jovens tenham acesso ao mercado de trabalho em condições justas e equitativas”.
A Presidência da República argumentou que PcDs e jovens aprendizes podem ser alocados em atividades-meio ou administrativas, além de reforçar a ilegitimidade ativa da Fenaval. Por sua vez, o Senado acompanhou esse entendimento, acrescentando que a exclusão das cotas não se justifica pelas especificidades de cada setor. A Câmara enfatizou que o sistema de cotas foi implementado para promover a inclusão social e a inserção no mercado de trabalho de PcDs, bem como proporcionar capacitação adequada de jovens no país. A PGR também se manifestou nesse mesmo sentido.
Outra ação sobre o mesmo tema, a ADI 7.693, apresentada pela Associação Brasileira das Empresas de Transporte de Valores (ABTV), também contesta a constitucionalidade das normas, sob o argumento de que, apesar dos esforços do setor para cumprir as cotas, não existem PcDs qualificados que possam ser legalmente contratados nos termos exigidos pela Polícia Federal. O ministro Gilmar Mendes também é o relator dessa ação.
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