A J&F Investimentos, holding da família Batista, e a multinacional indonésia Paper Excellence anunciaram nesta quinta-feira (15) um acordo que encerra uma das mais longas e complexas disputas empresariais do país. Com o pagamento à vista de US$ 2,64 bilhões (aproximadamente R$ 15 bilhões), a J&F adquiriu os 49,4% restantes da Eldorado Brasil Celulose, assumindo o controle total da companhia e colocando fim a processos judiciais e arbitrais iniciados em 2017.
Em comunicado conjunto, as empresas afirmaram que a transação “atende plenamente aos interesses de ambas as partes” e extingue “de forma plena e definitiva” todos os litígios em curso. O valor garante um retorno expressivo à Paper Excellence, que havia investido cerca de US$ 1,2 bilhão (R$ 3,8 bilhões) para adquirir sua participação na Eldorado.
O INÍCIO DO CONFLITO E A ARBITRAGEM
A disputa começou em setembro de 2017, quando J&F e Paper Excellence firmaram um contrato para a venda de 100% das ações da Eldorado, estimada em R$ 15 bilhões. Como parte do acordo, a Paper adquiriu imediatamente 49,41% da companhia por R$ 3,8 bilhões e deveria comprar os 50,59% restantes em até um ano, mediante o cumprimento de condições precedentes, como a liberação de garantias vinculadas à J&F.
No entanto, em setembro de 2018, a Paper não conseguiu cumprir essas exigências no prazo. A empresa alegou que a J&F e a Eldorado não colaboraram, e levou o caso à arbitragem. Em fevereiro de 2021, uma sentença arbitral parcial foi proferida em favor da Paper Excellence.
A J&F, por sua vez, contestou a sentença e buscou sua anulação na Justiça, sob acusações de graves irregularidades no processo arbitral, incluindo:
Espionagem: a interceptação de mais de 70 mil e-mails trocados entre a J&F e seus advogados foi comprovada pela polícia;
Quebra de imparcialidade: o árbitro indicado pela Paper teria omisso uma sociedade de fato com o escritório de advocacia da empresa estrangeira;
Ilegalidades nas ordens arbitrais: a J&F alegou que o conteúdo da decisão violava normas processuais.
Em julho de 2021, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) suspendeu os efeitos da arbitragem por unanimidade, apontando “nódoa” no procedimento. No ano seguinte, a juíza Renata Maciel, da 2ª Vara Empresarial de São Paulo, julgou improcedente a ação anulatória da J&F, restabelecendo a validade da sentença arbitral e elevando os honorários da defesa da Paper de R$ 10 milhões para R$ 600 milhões.
OBSTÁCULOS LEGAIS
Paralelamente à disputa arbitral, surgiram impedimentos legais relacionados à legislação sobre aquisição de terras por estrangeiros. A Paper, com capital majoritariamente estrangeiro, assumiria o controle de terras produtivas no Brasil sem apresentar autorizações do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) nem do Congresso Nacional — exigência prevista na Lei de Terras (Lei nº 5.709/1971).
Em abril de 2023, o Ministério Público Federal (MPF) ingressou com uma ação civil pública na Justiça Federal de Três Lagoas (MS), onde está localizada a sede da Eldorado, pedindo a anulação do contrato. Argumentava-se que a operação violava a soberania nacional e o ordenamento jurídico brasileiro.
Simultaneamente, uma ação popular em Santa Catarina também buscou impedir a transferência das ações da Eldorado à Paper até que houvesse regularização fundiária. Técnicos do Incra emitiram nota técnica em dezembro de 2023 reconhecendo que o contrato era nulo por ausência das devidas autorizações, sendo a única saída legal o desfazimento do negócio. A Advocacia-Geral da União (AGU) endossou esse entendimento.
Com base nesses argumentos, decisões do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) e da 3ª Região (TRF-3) suspenderam qualquer ato de transferência das ações. A Paper tentou, sem sucesso, derrubar essas decisões seis vezes — no TRF-4, TRF-3, STF, STJ e duas vezes na Justiça Federal de MS.
CONCILIAÇÃO NO STF E DESFECHO DA DISPUTA
Em novembro de 2024, o Supremo Tribunal Federal promoveu uma audiência de conciliação. Na ocasião, a J&F apresentou proposta formal para comprar a fatia da Paper na Eldorado, oferecendo o pagamento imediato, a valor de mercado, com garantias bancárias.
A Paper resistiu, inclusive tentando remover o processo arbitral do Brasil para uma “jurisdição neutra”, como Paris, mas teve seu pedido negado em março de 2025 pela Corte Internacional de Arbitragem. No mesmo mês, o TJ-SP acolheu os argumentos da J&F e anulou a sentença da juíza Renata Maciel, reabrindo o caso e determinando que fosse redistribuído a outro magistrado.
Pressionada pela sequência de derrotas judiciais e pela incerteza jurídica no Brasil, a Paper Excellence aceitou em maio de 2025 os termos propostos anteriormente pela J&F.
A conclusão do acordo representa o encerramento da mais complexa e valiosa disputa empresarial do Brasil nos últimos anos, envolvendo questões contratuais, arbitrais, jurídicas, fundiárias e até constitucionais. O desfecho marca também uma vitória estratégica da J&F, que retoma o controle integral da Eldorado, mantendo sua posição de destaque no setor de celulose.
Já a Paper deixa o país com retorno financeiro significativo e com reputação arranhada, diante das reiteradas críticas de descumprimento da legislação brasileira.
Com a operação concluída, a Eldorado Brasil Celulose passa a ser 100% controlada pela J&F Investimentos.
O post Maior disputa jurídica do país chega ao fim: J&F compra participação da Paper Excellence na Eldorado e encerra disputa apareceu primeiro em JuriNews.