Dia desses, um colega me perguntou se eu havia tomado conhecimento da intenção da OAB de criar um novo código “anti-ostentação” para advogados nas redes sociais.
Além de recorrente e, convenhamos, um tanto aborrecente, esse tema volta e meia reaparece na mídia.
Segundo o presidente da entidade, Beto Simonetti, em entrevista à CNN Brasil, há centenas de procedimentos em andamento para apurar condutas inadequadas na internet.
A nova norma, de acordo com suas declarações, pretende aperfeiçoar a regulamentação do marketing jurídico à luz das novas tecnologias.
Ainda que a intenção de resguardar a dignidade da profissão seja louvável, é preciso ponderar os riscos de uma abordagem excessivamente restritiva.
O mercado jurídico passou por uma transformação significativa, e as redes sociais tornaram-se ferramentas indispensáveis não apenas para aproximar o advogado do cliente, mas também para a humanização da advocacia.
Partir do pressuposto de que a exposição nas redes sociais é, por si só, uma ameaça à seriedade da profissão parece um equívoco.
Na realidade, ela pode ser um reflexo da modernização do setor.
O argumento de que a ostentação pode “ofender o brio” de advogados que ainda não atingiram estabilidade financeira é preocupante.
Afinal, a ascensão profissional e o sucesso econômico são consequências naturais de um trabalho bem-sucedido e não devem ser tratados como algo a ser velado.
Advogados devem, sim, agir com responsabilidade e ética, mas sem que isso signifique cercear sua liberdade de expressão ou criar um padrão artificial de comportamento nas redes.
Já disse mais de uma vez: ‘ostentação’, quando fruto do trabalho árduo e da criatividade, deve ser vista como uma expressão da realização individual.
O sucesso de uma pessoa não é a causa da miséria de outra; ao contrário, ele pode servir de inspiração e exemplo.
A sociedade deve valorizar aqueles que utilizam suas habilidades e talentos para criar valor, em vez de demonizá-los.
Outro ponto vital é a subjetividade do conceito de “ostentação”. Afinal, o que se enquadra nesse rótulo?
Filmar seu dia a dia? Mostrar seu carro, seus relógios, sapatos e ternos? Compartilhar suas viagens e casas?
O simples fato de expor conquistas materiais deve ser visto como uma afronta ou como uma celebração legítima do esforço pessoal?
Sem critérios objetivos, corremos o risco de adentrar um território nebuloso onde qualquer manifestação pode ser alvo de sanção disciplinar, abrindo margem para interpretações arbitrárias.
Além disso, as próprias diretrizes da OAB já preveem punições para condutas que ultrapassem os limites éticos.
Se existem “centenas de processos” já em andamento, significa que os mecanismos de controle estão funcionando dentro da estrutura normativa vigente.
Criar mais uma camada regulatória pode acabar gerando um efeito inibidor desnecessário, prejudicando a inovação e o dinamismo da própria advocacia.
Outro aspecto preocupante é o impacto que essa regulamentação pode ter sobre as redes pessoais dos advogados.
Ainda que a OAB tenha o dever de preservar a ética profissional, avançar para o campo da vida privada pode gerar um efeito colateral indesejado: um controle excessivo da individualidade dos advogados.
Cada profissional tem o direito de expressar suas conquistas e sua rotina como bem entender, desde que respeite os princípios da dignidade e da honestidade.
A distinção entre o que é pessoal e o que é profissional precisa ser respeitada para que esse tipo de norma não se transforme, na prática, em uma forma velada de censura.
Vale lembrar que, no âmbito jurídico, diferentes esferas de responsabilidade já são contempladas por nossa legislação.
Para cada violação na esfera civil, há normas aplicáveis; para cada infração na esfera criminal, há a devida previsão legal.
As violações éticas, por sua vez, estão ligadas ao comportamento e refletem uma postura que pode comprometer a transparência das atividades.
Trata-se, portanto, da transgressão de regras, convenções e limites, sejam eles impostos por leis ou delineados pelas normas sociais e profissionais.
Em vez de restringir, é preciso investir em campanhas educativas para que advogados façam um uso responsável das redes sociais sem que isso comprometa sua liberdade de expressão.
Afinal, a advocacia não pode se fechar em um modelo ultrapassado, sob pena de perder relevância na sociedade conectada em que vivemos.
O desafio não é proibir, mas equilibrar. E para isso, o caminho não pode ser o da censura, mas sim o da responsabilidade e do bom senso.
E como bem disse Rui Barbosa: “Onde há um direito violado, haverá sempre um advogado ou uma advogada para defendê-lo. Onde há arbítrio, haverá advocacia para enfrentá-lo”.
Que essa essência jamais se perca, nem mesmo dentro da própria classe.
Nelson Wilians é advogado, fundador e presidente do Nelson Wilians Advogados
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