A OABRJ protocolou, nesta segunda-feira (3), uma reclamação disciplinar na Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) solicitando a instauração de um Processo Administrativo Disciplinar contra o juiz federal Marcelo da Costa Bretas, titular da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro. De acordo com a entidade, Bretas, afastado cautelarmente de suas funções desde fevereiro de 2023, tem exercido atividades de coaching e autopromoção, condutas vedadas pela legislação aplicável à magistratura.
Segundo a reclamação, Bretas está se valendo da exposição que recebeu durante a “lava jato” para fazer “autopromoção desmedida e superexposição” e usa as redes sociais para vender mentorias. Para tanto, se apresenta como “juiz federal”, “palestrante” e “professor”.
A OAB-RJ pediu que seja aberto processo administrativo disciplinar para apurar a atuação do juíz, bem como a suspensão de seus perfis nas redes sociais e a nova decisão determinando o afastamento cautelar do magistrado.
Em seu perfil no Instagram, Bretas vende uma mentoria batizada de “Método o Quarto Poder”, em que promete “transformar” a carreira de profissionais de áreas diversas. Já na “Comunidade o Quarto Poder”, o juiz promete ensinar como “argumentar e se posicionar como uma autoridade”. Há também ofertas de serviços de newsletter.
Bretas está afastado de suas funções desde fevereiro de 2023, mas ainda recebe como juiz. Ele é alvo de três reclamações disciplinares que tramitam em sigilo.
O QUE DIZ A OAB
Segundo a reclamação, o fato de Bretas estar afastado de suas funções não livra o juiz do dever de “estrita observância aos ditames constitucionais e legais” que norteiam a magistratura.
“Ao contrário, justamente em virtude da imposição desta excepcional medida, deve o juiz, durante a sua duração (do afastamento), ter redobrado cuidado no cumprimento dos seus deveres, até mesmo como forma de demonstrar, com o seu comportamento, sua plena disposição em retornar à prática da jurisdição com a honra e a dignidade que se esperam de integrantes do Poder Judiciário”, diz trecho da reclamação. O texto é assinado por Marcos Luiz Oliveira de Souza, procurador-geral da OAB-RJ, e Thiago Gomes Morani, subprocurador-geral da entidade.
A OAB fluminense também questiona a organização de palestras e a adesão, mediante pagamento, a uma comunidade fechada em que os participantes recebem a promessa de aprender “diretamente com um juiz federal”.
“(Isso) Demonstra, acima de qualquer dúvida razoável, a utilização ostensiva da função jurisdicional como elemento central da atratividade e valor agregado à proposta comercial. O caráter personalista dessa iniciativa é evidente, onde a figura do magistrado é explorada como diferencial competitivo”, diz a OAB-RJ.
Ainda segundo a reclamação, o juiz acumula a atuação como coaching e o posto de juiz, ainda que afastado. “O magistrado reclamado continua a acumular as duas funções. E vem sendo muito bem remunerado.”
CNJ VEDA PRÁTICA
A Resolução 34/2007 do CNJ veda a prática de coaching. Conforme o entendimento do Conselho, a atuação não se equipara à hipótese de atividade docente e é proibida para magistrados.
“Aos magistrados da União e dos Estados é vedado o exercício, ainda que em disponibilidade, de outro cargo ou função, salvo o magistério. (…) As atividades de coaching, similares e congêneres, destinadas à assessoria individual ou coletiva de pessoas, inclusive na preparação de candidatos a concursos públicos, não são consideradas atividade docente, sendo vedada a sua prática por magistrados”, diz trecho da resolução.
A OAB-RJ também cita no pedido a Resolução 305/2019 do CNJ, segundo a qual o uso de redes sociais por magistrados deve observar preceitos contidos na Lei Orgânica da Magistratura e no Código de Ética da Magistratura. O texto também veda “manifestações que busquem autopromoção ou superexposição”.
Por fim, a entidade diz que tanto a Lei Orgânica quanto o Código de Ética proíbem “comportamentos que impliquem a busca injustificada e desmesurada por reconhecimento social”.
“O robusto conjunto fático probatório acima delineado revela a reiteração sistemática de condutas vedadas pelo CNJ pelo Juiz Federal Marcelo Bretas, perpetradas no curso do seu período de afastamento cautelar do exercício funcional, consistente na oferta comercial de atividades típicas de coaching, valendo-se de sua condição de Juiz Federal para a obtenção de vantagens de natureza pessoal e econômica, associada à autopromoção desmedida e superexposição”, diz a reclamação.
LEIA OS PEDIDOS DA OAB-RJ:
1) A instauração de Processo Administrativo Disciplinar, considerando a vistosa presença de elementos concretos que evidenciam a prática, pelo magistrado reclamado, de condutas atentatórias aos artigos 5º-A da Resolução CNJ nº. 34/2007; artigos 2º, 3º, inciso I, alíneas ‘a’ e ‘b’, inciso II, alíneas ‘a’, ‘b’ e ‘c’ e 4º, incisos IV e VI, da Resolução CNJ nº.305/2019; artigos 26, inciso II, alínea ‘a’ e 36, inciso I, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e artigos 13, 16, 21, caput e § 2º, do Código de Ética da Magistratura Nacional, durante o seu período de afastamento cautelar ordenado pelo CNJ no curso do processo nº. 0006499- 58.2022.2.00.0000;
2) A suspensão cautelar dos perfis em redes sociais do magistrado reclamado, para prevenir a reiteração das condutas que afrontam as normas regulamentares que regem a magistratura brasileira;
3) A imposição de afastamento cautelar do magistrado reclamado das suas funções também como decorrência da instauração do presente feito, de modo a garantir a ordem pública e reafirmar a credibilidade da Justiça.
AFASTAMENTO
Bretas está afastado do cargo há dois anos. Na ocasião do afastamento, o CNJ analisou três reclamações disciplinares contra o juiz.
Um dos pedidos foi feito pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, com base em reportagem da revista Veja segundo a qual Bretas negociou penas, orientou advogados e combinou estratégias com o Ministério Público. A publicação se baseou em delação do advogado criminalista Nythalmar Dias Ferreira Filho.
Segundo a OAB, Bretas violou deveres de imparcialidade e tratamento urbano com as partes, entre outros previstos no artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional, culminando, inclusive, em desrespeito às prerrogativas dos advogados.
O segundo processo foi ajuizado pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, que apontou a condução de um acordo de colaboração premiada baseado apenas em informações repassadas por terceiro, cujo intuito, segundo ele, era favorecer a candidatura de Wilson Witzel ao governo estadual em 2018.
O caso é o da delação premiada de Alexandre Pinto, ex-secretário municipal de Obras do Rio, que envolveu Paes em um esquema de propinas no plano de infraestrutura da Olimpíada de 2016. Ele chegou a admitir que não estava presente no momento em que Paes teria acertado um pagamento à construtora Odebrecht.
A defesa do prefeito pediu acesso ao material da delação, mas Bretas alegou sigilo do caso e negou. Mesmo assim, alguns trechos do depoimento vazaram. Na época em que a delação veio à tona, Paes liderava as pesquisas de intenção de voto para o governo do Rio. Porém, ao fim, Witzel foi eleito.
A terceira reclamação disciplinar foi ajuizada pela Corregedoria Nacional de Justiça, a partir de correição extraordinária determinada pelo corregedor e coordenada pelo desembargador Carlos von Adamek.
COM INFORMAÇÕES DO CONJUR E OAB-RJ.
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