É possível a contratação de serviços advocatícios sem licitação. Mas, além dos requisitos já previstos de forma expressa na antiga Lei de Licitações e Contratos (necessidade de procedimento administrativo formal; notória especialização profissional; serviço de natureza singular), a contratação só pode ocorrer quando a prestação do serviço pelos integrantes do poder público for inadequada; e desde que a cobrança do serviço contratado seja compatível com o preço de mercado.
O julgamento de repercussão geral em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal discute a possibilidade de entes públicos contratarem serviços jurídicos foi interrompido nesta sexta-feira (28) por causa de um pedido de vista do ministro André Mendonça, e será retomado em data ainda não definida. A análise do caso estava marcada para terminar às 23h59 desta sexta.
Antes da interrupção, os ministros formaram maioria para estabelecer que é possível a contratação de serviços advocatícios sem licitação, mas, além dos requisitos já previstos de forma expressa na antiga Lei de Licitações e Contratos (necessidade de procedimento administrativo formal; notória especialização profissional; serviço de natureza singular), a contratação só pode ocorrer quando a prestação do serviço pelos integrantes do poder público for inadequada; e desde que a cobrança do serviço contratado seja compatível com o preço de mercado.
Os ministros também discutem, neste mesmo julgamento, em quais casos essa contratação configura improbidade administrativa. A discussão acabou evoluindo para uma definição sobre a inconstitucionalidade ou não da modalidade culposa de ato de improbidade (em que não há intenção de cometê-lo), mas ainda não houve consenso.
Seis ministros já votaram e concordaram em estabelecer os mesmos critérios para a contratação direta de serviços jurídicos. Mas quatro deles consideraram que a modalidade culposa de improbidade é inconstitucional, enquanto dois discordaram e se opuseram a incluir essa ideia na tese de julgamento.
A Corte julga dois recursos extraordinários sobre o mesmo tema. Eles tratam de uma ação civil pública do Ministério Público de São Paulo contra a contratação, feita pela Prefeitura de Itatiba (SP), de um escritório para a prestação de serviços técnicos de advocacia.
A análise envolve três dispositivos da antiga Lei de Licitações e Contratos (de 1993, revogada em 2021) que dispensam a licitação quando houver inviabilidade de competição e para a contratação de serviços técnicos, como o patrocínio ou defesa de causas judiciais e administrativas.
Outro ponto do julgamento é verificar se tais contratações de serviços jurídicos configuram improbidade administrativa.
VOTO DO RELATOR
O ministro Dias Toffoli, relator do caso, votou a favor da possibilidade de contratação sem licitação e estabeleceu os critérios adicionais. Ele ainda entendeu que a contratação de serviços advocatícios sem licitação prévia por parte de prefeituras só é válida se não houver norma municipal que a impeça.
Até o momento, Toffoli foi acompanhado na íntegra por Flávio Dino, Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin.
Para o magistrado, é inviável a competição envolvendo a contratação de serviços jurídicos, uma vez que envolve profissionais especializados de modo diferenciado e não há critérios objetivos para comparar os potenciais competidores.
“Há determinados serviços que demandam primor técnico diferenciado, detido por pequena ou individualizada parcela de pessoas, as quais imprimem neles características diferenciadas e pessoais. Trata-se de serviços cuja especialização requer aporte subjetivo, o denominado ‘toque do especialista’, distinto de um para outro, o qual os qualifica como singular”, disse o relator em seu voto.
De acordo com ele, se os serviços em questão “são prestados com características subjetivas, consequentemente são julgados de modo subjetivo, afastando a objetividade e, com ela, a competitividade, não se justificando a necessidade de instauração da licitação pública”.
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Grande parte do voto de Toffoli se dedica a analisar se os casos em que há a contratação dos serviços jurídicos sem que sejam cumpridos os requisitos necessários consistem ou não em atos de improbidade administrativa.
O ministro considerou que o dolo (intenção) é um requisito para qualquer ato de improbidade administrativa. Assim, para ele, é inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade, prevista na redação original da Lei de Improbidade Administrativa (LIA)
“A culpa, inclusive quando grave, não é suficiente para que a conduta de um agente seja enquadrada em ato de improbidade administrativa, qualquer que seja o tipo desse ato”, assinalou.
O ministro citou a nova LIA, que estabeleceu a necessidade do dolo para que a conduta de um agente configure ato de improbidade administrativa.
“Penso eu que essa modificação legislativa somente corrobora o que sustento no presente voto: a improbidade administrativa sempre demandou o dolo.”
DIVERGÊNCIA
O ministro Luís Roberto Barroso divergiu do relator em alguns pontos — entre eles, a validade dos atos de improbidade culposos.
Barroso lembrou que, em 2022, o Supremo manteve a validade de condenações por atos de improbidade culposos anteriores à edição da nova LIA. Na ocasião, a Corte também não impediu o Legislativo de aprovar alguma norma que restabeleça a punição por atos de improbidade com culpa.
Por isso, o ministro sugeriu corrigir a tese de Toffoli e não estabelecer a inconstitucionalidade da modalidade culposa de ato de improbidade administrativa (já que isso não foi decidido na ação que discutia o tema). Ele ainda propôs ressaltar que o dolo também é necessário para atos praticados antes da nova LIA, desde que não haja condenação transitada em julgado.
Já o ministro Edson Fachin também concordou com os critérios de contratação propostos por Toffoli e acompanhou a tese de Barroso com relação ao dolo nos atos de improbidade.
Com informações da Conjur
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