Na ausência de uma lei de organização judiciária que discipline o tema, os tribunais devem considerar tempestivas as petições protocoladas até as 20h do último dia do prazo, mesmo que o expediente forense já tenha se encerrado. A decisão foi tomada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e representa uma mudança de entendimento para os processos regidos pelo Código de Processo Civil de 1973.
O CPC de 1973, em seu artigo 172, estabelecia que os atos processuais deveriam ser realizados em dias úteis, das 6h às 20h. O parágrafo 3º desse artigo determinava que petições com prazo determinado deveriam ser apresentadas “dentro do horário de expediente, nos termos da lei de organização judiciária local”. Com isso, os tribunais poderiam alterar o horário limite para protocolo ao modificar seu expediente forense.
Em 2016, um precedente da Corte Especial (EREsp 1.341.710) interpretou que essa definição poderia ser feita por ato colegiado administrativo. No julgamento do EREsp 1.7458.55, realizado em (19), o STJ alterou esse entendimento e determinou que qualquer limitação ao horário para peticionamento deve ser estabelecida exclusivamente por lei de organização judiciária, prevista no artigo 125, parágrafo 1º da Constituição Federal.
Caso do TJ-PI
O entendimento foi aplicado em recursos contra decisões do Tribunal de Justiça do Piauí (TJ-PI), que havia declarado a intempestividade de apelações. Em um dos casos, julgado em 2025, uma apelação foi protocolada às 15h20 de uma sexta-feira, último dia do prazo. O TJ-PI considerou o recurso intempestivo com base em uma resolução administrativa que estabelecia o expediente das 7h às 14h, sendo o período das 14h às 18h reservado para plantão de urgências.
Por maioria, a Corte Especial do STJ decidiu que uma resolução administrativa não é suficiente para restringir o horário de protocolo de petições, conforme previa o artigo 172, parágrafo 3º do CPC de 1973. O voto do relator, ministro Raul Araújo, foi acompanhado pelos ministros Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Sebastião Reis Júnior, Nancy Andrighi e João Otávio de Noronha.
Dessa forma, o TJ-PI deverá receber e julgar a apelação, protocolada em 2010, em um processo tributário iniciado em 2006.
Voto do relator
Para Raul Araújo, se não houver uma lei de organização judiciária disciplinando o expediente, as petições devem ser aceitas até as 20h. Ele criticou a restrição imposta pelo TJ-PI, afirmando que “é uma demasia, uma extravagância” impedir o protocolo após as 14h. “O tribunal pode definir horários de funcionamento, mas não pode prejudicar a prática dos atos processuais, reduzindo drasticamente os prazos”, afirmou.
Divergência
O ministro Luis Felipe Salomão abriu divergência, acompanhado por Ricardo Villas Bôas Cueva, Humberto Martins e Herman Benjamin. Para Salomão, a fixação do horário de expediente está inserida no poder de autogestão dos tribunais e pode ser regulamentada por ato normativo colegiado, conforme entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal.
Ele também apontou a insegurança jurídica causada pela mudança jurisprudencial do STJ, em vigor desde 2016. “Se o tribunal local pode definir diretrizes para horário de protocolo e considera intempestivo um recurso fora desse período, imaginem a quantidade de recursos que surgiram sobre esse tema”, disse.
Impacto no CPC de 2015
O CPC de 2015 reproduziu a regra interpretada pelo STJ no artigo 212, caput e parágrafo 3º. No entanto, a questão pode ser afetada pelo avanço do processo eletrônico, que já responde pela maior parte das petições.
A Lei 11.419/2006, que trata da informatização do processo judicial, prevê em seu artigo 10º, parágrafo 1º, que petições eletrônicas serão consideradas tempestivas se protocoladas até as 24h do último dia do prazo.
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