A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a ordem para que duas crianças retornem ao Brasil, no caso envolvendo Raquel Cantarelli, brasileira acusada de “sequestro internacional” por deixar a Irlanda com as filhas em 2019. Raquel afirma ter fugido do país para protegê-las de abusos praticados pelo ex-marido.
A decisão foi tomada no julgamento de embargos de declaração apresentados pela Advocacia-Geral da União (AGU). Embora o mérito da decisão anterior tenha sido mantido, o colegiado, sob relatoria do ministro Gurgel de Faria, reconheceu a necessidade de detalhar os mecanismos legais disponíveis à União para garantir a efetividade da ordem de retorno das crianças ao Brasil.
Entenda o caso
De acordo com o processo, Raquel decidiu deixar a Irlanda após perceber sinais de abuso sexual na filha mais velha, então com dois anos. Mesmo após denunciar o caso às autoridades locais, as investigações foram arquivadas. Ela também relatou ter sofrido restrições de liberdade. Com apoio da Embaixada do Brasil e da Polícia Federal, Raquel retornou ao país com as filhas, em uma operação descrita judicialmente como um “resgate”.
O pai das crianças, com apoio da União, entrou com ação no Brasil com base na Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, pedindo o retorno imediato das menores à Irlanda. Inicialmente, o pedido foi negado com base na cláusula de exceção que prevê risco grave à integridade das crianças. No entanto, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região reverteu a decisão e determinou o envio das meninas ao exterior. Em junho de 2023, elas foram retiradas à força da casa da mãe e entregues ao pai. Desde então, Raquel não teve mais contato com as filhas.
Vitória no STJ
Em dezembro de 2024, a 1ª Turma do STJ reformou a decisão do TRF e restabeleceu a sentença original, reconhecendo o risco real às crianças e determinando seu retorno ao Brasil. O ministro Gurgel de Faria destacou que o caso não se tratava de julgar o pai, mas de proteger o interesse das menores, com base em laudos, relatórios consulares e manifestações do Ministério Público Federal.
Entre os fatores citados no voto estão:
- Medida protetiva concedida à mãe ainda em 2019;
- Indícios de abuso confirmados por perícia;
- Avaliação psicológica que apontou possíveis traumas com a separação e retorno forçado;
- Ausência de conclusão judicial sobre as denúncias por causa da pouca idade das vítimas.
O relator também criticou a falta de medidas que garantissem o contato das crianças com a mãe: “A Justiça sequer se preocupou em assegurar que houvesse, ao menos, comunicação por videochamada”.
Nova etapa
Os embargos de declaração da AGU foram parcialmente acolhidos, apenas para esclarecer que a ordem do STJ confere à União liberdade para usar diversos instrumentos — como cooperação jurídica internacional e proteção diplomática — para efetivar o retorno das crianças.
Segundo o advogado de Raquel, Vinicius Melo, inicia-se agora uma nova fase da batalha judicial. Ele ressaltou o papel da Defensoria Pública na reversão da decisão que separou mãe e filhas e defendeu a responsabilização dos envolvidos. “Estamos diante de um dos maiores equívocos do Judiciário desde a redemocratização. É necessário responsabilizar toda a cadeia de profissionais envolvida nessa decisão traumática, inclusive o próprio Estado brasileiro em âmbito internacional”, afirmou.
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