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TRF-3 aceita denúncia contra legistas por crimes na ditadura militar e afasta Lei da Anistia

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A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) decidiu, por maioria, dar provimento a um recurso do Ministério Público Federal (MPF) e receber denúncia contra os médicos-legistas Harry Shibata e Antonio Valentini. Eles são acusados dos crimes de falsidade ideológica e ocultação de cadáver durante a ditadura militar. A decisão afasta a aplicação da Lei de Anistia e determina que o juízo de primeiro grau prossiga com a ação penal.

O entendimento que prevaleceu foi que a rejeição da denúncia só deve ocorrer em casos de inépcia formal, falta de pressuposto processual ou ausência de justa causa. Em situações de dúvida quanto ao mérito, deve ser aplicado o princípio in dubio pro societate, que favorece a instauração da ação penal.

Shibata e Valentini são acusados de elaborar laudos necroscópicos falsos sobre as mortes de Sônia Maria de Moraes Angel Jones e Antônio Carlos Bicalho Lana, ocorridas em 1973.

A denúncia do MPF havia sido inicialmente rejeitada pela 6ª Vara Federal de São Paulo, sob o argumento de que a punibilidade dos acusados estava extinta pela Lei de Anistia (Lei 6.683/79), que perdoou crimes políticos e conexos praticados durante o período da ditadura militar.

No recurso, o MPF sustentou que os crimes cometidos pelos legistas se enquadram como crimes contra a humanidade e, portanto, não seriam passíveis de anistia ou prescrição. O parquet argumentou ainda que a decisão da 6ª Vara Federal contraria a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) em julgamento proferido contra o Brasil, o que implicaria descumprimento de pactos internacionais assumidos pelo país.

JURISDIÇÃO INTERNACIONAL

Ao analisar o caso, o relator, desembargador Paulo Fontes, afirmou que não há dúvidas de que o Brasil está sujeito à jurisdição da Corte Interamericana. Ele destacou que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na ADPF 153, que considerou a Lei de Anistia recepcionada pela Constituição de 1988, não impede o cumprimento da decisão da Corte IDH.

A necessidade de compatibilidade normativa tanto com a Constituição Federal quanto com a Convenção Interamericana fica muito clara com a decisão do STF no HC 90172/SP, que culminou na Súmula Vinculante nº 25, que veda a prisão civil do depositário infiel. Tal modalidade de prisão foi considerada incompatível com o Pacto de São José da Costa Rica, embora seja permitida pela Constituição brasileira. Assim sendo, a Lei de Anistia pode igualmente mostrar-se compatível com a Constituição e incompatível com a Convenção”, explicou Fontes.

O relator afirmou que, conforme decisão da Corte IDH, era necessário afastar a alegação de que os crimes imputados aos legistas teriam prescrito ou seriam enquadrados na Lei de Anistia.

Vale ressaltar que, ainda que os réus não tenham sido denunciados pelos crimes de homicídio praticados contra as vítimas, no presente caso, os crimes de falsidade ideológica e ocultação de cadáver possuem caráter de lesa humanidade, uma vez que são conexos com os crimes mais gravosos praticados durante a ditadura militar contra as vítimas Sônia e Antônio Carlos, por visarem assegurar a impunidade e mascarar as reais práticas utilizadas para a morte delas”, pontuou o desembargador.

Fontes também citou precedente da 4ª Seção do TRF-3, que, em julgamento de caso similar ao dos legistas, entendeu que a ocultação de cadáver se tratava de crime permanente, uma vez que os corpos das vítimas não haviam sido encontrados.

Por fim, o relator aplicou o princípio in dubio pro societate para receber a denúncia e ordenar o retorno dos autos ao juízo de origem para o prosseguimento da ação penal. O voto de Paulo Fontes foi seguido pela juíza convocada Raclaer Baldresca.

O desembargador Ali Mazloum ficou vencido, divergindo do relator. O magistrado entendeu que os delitos haviam prescrito, já que ainda não há lei que tipifique os crimes contra a humanidade no Brasil.

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